Fonte: Tribuna da Imprensa - Sonia Racy
Estadão
Nos últimos 20 anos, houve uma evolução do eleitor brasileiro. Mais informado, mais educado, crítico e atento, participativo – inclusive nas redes sociais. Já o político “made in Brazil” parou no tempo. Repete as mesmas práticas de 30 anos, busca o mesmo jeito de financiar campanha e é adepto do “é dando que se recebe”, do caixa 2, do nepotismo, de jatinhos e helicópteros. Não se deu conta de que o mundo mudou, de que a era da internet e dos celulares alterou todo o cenário.
A opinião acima é de Carlos Augusto Montenegro, do Ibope, para quem a descrença do povo brasileiro na política cresceu barbaramente. “Se não houvesse voto obrigatório, 60% da população não compareceria às urnas”, previu o também ex-presidente do Botafogo, em seu escritório do Rio. Para Montenegro, os políticos vão ter uma resposta muito séria da população.
Como o senhor está vendo esta eleição?
Estou aqui há 42 anos e acho que esta é a eleição mais difícil da história do Ibope. A impressão que me dá é de que realmente o Brasil precisa fazer uma reforma política, mas fazer mesmo. Sinto que as pessoas estão nauseadas, enfadadas, não sei nem o termo, estão enojadas. A princípio, pela leitura das pesquisas hoje, quem é o grande ganhador da eleição? Ninguém. Está cada vez maior a fatia de branco, nulo, indeciso. O desânimo é com tudo, é com a política, é a confusão. A página de mensalão foi uma página diferente, o pessoal achava que a impunidade era total e, de repente, alguma coisa aconteceu. Na hora em que você está acabando de virar a página, vem uma confusão maior ainda com o caso da Petrobrás, que sempre foi uma empresa muito querida do povo brasileiro. O volume de informação, de denúncias é tão grande que dá a impressão de que isso aconteceu 40 dias atrás ou ontem. Não passa a impressão de que isso foi em 2006 ou em 2008. Você vê Polícia Federal invadindo a Petrobrás, gente sendo presa, é doleiro, é diretor, é o ex-presidente da estatal dizendo que foi certo e a atual dizendo que foi errado. Aécio tem seus problemas com o mensalão mineiro, Eduardo Campos tem seus problemas também. O fato é que o pessoal não aguenta mais toda essa confusão.
Como isso aparece nas pesquisas? Fora voto nulo e branco, há alguma outra maneira?
Na resposta à pergunta “se as pessoas têm interesse pela política ou pelo noticiário político”, isso aparece cada vez mais. As opções “pouco interesse” ou “nenhum interesse” representam mais da metade. Se o voto fosse facultativo, quase 60% não votariam nesta eleição. As manifestações do ano passado já foram um aviso disso. Eu diria que qualquer um dos candidatos que vencer a eleição será uma zebra – qualquer um, porque o desânimo, a tristeza com a política, a falta de sonhos e de programas é imensa. O desencanto é tão grande que, acredito, qualquer um que ganhar será uma surpresa para mim. Aí, você pode perguntar: mas até a Dilma? Até ela, que era favorita absoluta há um ano e pouco. Mas a agenda está ruim.
Então, qual a finalidade das pesquisas eleitorais?
As pesquisas, às vezes, até servem para falar o que eu estou te falando: que o desencanto hoje é total. Atualmente, tem 70% mais ou menos querendo mudança, mas eles não sabem bem que mudança seria essa, nem com quem. Já houve época em que o Brasil quis continuidade: foi assim em 1998, 2006 e 2010. Em 2002, os eleitores queriam mudança.
E os candidatos que estão concorrendo com a situação, o senhor diria que nenhum deles trouxe uma grande novidade?
Nenhum trouxe um programa, um sonho, uma ideia. Aí podem falar que não são conhecidos, não têm tempo de televisão etc. Todos os candidatos já foram governadores ou senadores de estados importantes, a imprensa está abrindo espaço para falar de projeto. Não adianta um ficar atacando o outro, o ruim fica pior. O ambiente já é horrível, falta esperança. E jogar lama? Eu sou melhor que você, você é ruim e eu não sou tão ruim. Está tudo muito negativo.
Pode aparecer uma surpresa até o final da eleição?
Não acredito. O brasileiro também já está vacinado contra surpresa depois de 1989. O Collor foi uma decepção em relação a várias coisas, o confisco, o impeachment. Não acredito que haverá um milagre, um coelho saindo da cartola. Muita gente fala da volta do Lula, se é possível ou não, uma especulação. O Lula, obviamente, é mais político, mais jeitoso, mais ídolo, mas também todas essas confusões que estão aparecendo agora aconteceram no governo dele. Acho que o partido atual no poder tem de tomar cuidado, porque é óbvio que tem um projeto de governo de 12 anos e tem gente querendo substituir esse projeto de governo de 12 anos, uma briga tremenda.
Se o Lula voltasse, ganharia?
Não sei. Isso tem um timing. Eu acho que, por enquanto, você pode dizer o seguinte: a Dilma foi antipática, a Dilma não teve sapiência para tratar com os políticos ou paciência, o Lula é melhor. Pode ser. Mas pode ser, também, que o negócio fique tão estragado com essa confusão, que ninguém saiba onde isso tudo vai parar. O timing é o seguinte: até dia 30 de junho, o partido pode resolver se o candidato vai ser a Dilma ou o Lula