Artífice
de uma "nova política", que pediu para que os eleitores "não
desistam do Brasil", o ex-governador pernambucano Eduardo Campos foi
beatificado após a morte, como costuma acontecer com figuras públicas que
partem de forma trágica e inesperada. Foi homenageado nos programas eleitorais
do PT, do PSDB e teve sua imagem explorada à exaustão no de Marina Silva. No
entanto, Campos se foi, mas deixou uma conta pendente aqui na Terra. Afinal,
quem arcará com os prejuízos humanos e materiais deixados pelo jatinho PR-AFA,
que desabou sobre imóveis em Santos (SP), ceifando sete vidas?
As investigações iniciais da Polícia Federal revelam uma história escabrosa.
Oficialmente, o jato está registrado em nome do grupo Andrade, de Ribeirão
Preto, que pertence a um usineiro quebrado, acusado no passado de tentar
aplicar golpes na Petrobras. Como a aeronave não poderia ser vendida, porque
isso constituiria fraude a credores, foi arrendada a três empresários pernambucanos,
amigos de Eduardo Campos, que vinham pagando as parcelas pendentes do leasing.
Um é dono de uma factoring, ou seja, pode estar ligado ao financiamento ilegal
de campanhas eleitorais. Os outros dois trabalham com importações de pneus
chineses. Nenhum dos três pretende assumir a propriedade de um avião que também
não tinha seguro.
Como o jato PR-AFA voava de forma ilegal e sem proteção de uma seguradora, isso
indica que as famílias de colaboradores próximos a Eduardo Campos, como o
jornalista Carlos Percol e o fotógrafo Alexandre Severo, correm o risco de não
ser indenizadas. O mesmo vale para os proprietários dos imóveis em Santos, como
o dono de uma academia de ginástica, que perdeu R$ 1,5 milhão. Além dos
prejuízos em si, o episódio deixa uma pergunta no ar: por que esses três
empresários estavam pagando pelo avião de Eduardo? Qual era a origem dos
recursos? O que esperavam em troca?
De acordo com a lei eleitoral, nem todas as aeronaves podem ser usadas em
campanhas políticas. Apenas aquelas habilitadas a operar como táxi aéreo. Ou
seja: mesmo quando pertencem a empresas, como empreiteiras, as aeronaves só
podem ser emprestadas a candidatos quando registradas desta forma. E, quando
cedidas, compete aos partidos registrar na prestação de contas o montante
equivalente às horas de voo doadas. Até agora, o PSB não informou nada à
Justiça Eleitoral sobre os voos de Eduardo Campos antes de sua morte com o
PR-AFA. E esse é um imbróglio delicado, porque será necessário indicar o dono
da aeronave, de quem serão cobradas indenizações e danos materiais.
O caso representa também um problema para Marina Silva, que se coloca como
herdeira política do ex-governador pernambucano. Se ela, de fato, pretende
honrar o legado de Eduardo Campos, poderia reunir seus financiadores de
campanha e tomar, como primeira providência, o pagamento de reparações às
vítimas do desastre aéreo em Santos.
Não importa o que o passado
fez de mim. Importa o que eu faço com o que o passado fez de mim.
Derlei Catarina De Luca.