Fonte: Tribuna da Internet - Jorge Béja
A consciência jurídica de todos os povos e nações não pode aceitar a pena capital que a Justiça da República da Indonésia impôs ao brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos de idade. Nem a Marco Archer nem a qualquer outra pessoa humana. Nem pela Indonésia, nem por qualquer outra nação. A execução por fuzilamento está marcada para amanhã, sábado no Brasil (domingo, na Indonésia). Não está em causa o crime imputado a Marco Archer desde 2003. A reação é contra a extravagância da pena e sua desconformidade com o Direito Internacional.
O FIM DA PENA DE MORTE
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de Dezembro de 1948, reúne os ideais de uma sociedade universal em que a Vida Humana, mais do que qualquer outro bem e valor, tem absoluta preponderância sobre a mais dura penalidade que uma pessoa possa sofrer por ter violado o equilíbrio social. Se contrapõe, portanto, à pena de talião.
A independente e soberana República da Indonésia, ao ingressar em 1950 na Organização das Nações Unidas, da qual passou a ser membro e em cujo colégio tem assento, aceitou e subscreveu os diplomas internacionais pela ONU proclamados ao mundo. Deve-lhes, portanto, obediência, respeito e cumprimento. E o artigo III da referida Declaração dispõe que toda pessoa tem direito à Vida: “Todo homem tem direito à vida”.
Se lê e se vê que o legislador internacional não fez restrição nem ressalva. Logo, Direito à Vida implica em toda e qualquer situação que a pessoa humana se encontre, mesmo os condenados por cometimento de crime. Caso contrário, haveria de existir exceção expressa. E a excepcionalidade que justificasse a pena de morte, obrigatoriamente deveria constar no texto legal, como por exemplo: “Todo homem tem direito à vida, salvo no caso de condenação à pena capital”. A ausência da hipotética e exemplificativa restrição fez abolir, em todo o mundo e induvidosamente, a pena de morte. Já proclamava o Direito Romano que onde o legislador não restringiu, nem excepcionou, nem acresceu, não cabe ao intérprete restringir, excepcionar ou acrescer.
A PENA DE MORTE É DEGRADANTE
O artigo V da Declaração Universal dos Direitos do Homem também impõe ao mundo que ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano e degradante. Indaga-se: a pena de morte não é a mais hedionda tortura, o mais pungente tratamento, o mais crudelíssimo castigo, desumano e degradante imposto à pessoa humana que tenha sido condenado pela prática de crime? A proibição destas práticas que a Lei Internacional menciona não importa, à luz da razão e do Direito, na revogação da pena de morte?
SUPREMACIA DAS LEIS INTERNACIONAIS
É princípio do Direito Internacional Público que as Convenções e Tratados, uma vez subscritos por um Estado, suas disposições prevalecem sobre suas leis internas, ainda que estas sejam contrárias ao que ficou estabelecido no Tratado Internacional. É verdade que um dos princípios básicos do Direito Internacional está no respeito à soberania do Estado. Mas um Estado que desobedece os imperativos de convivência harmoniosa e de respeito recíproco com as demais Nações impostos por uma Convenção ou Tratado, tem a sua soberania comprometida no âmbito do Direito Internacional. Desafina. Afronta. Desafia.
A INDONÉSIA E A PENA DE MORTE
As nações que insistem manter em sua legislação interna a pena capital, como é o caso da Indonésia, não obstante o Direito à Vida, como proclamado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, tais nações desatendem ao que determinam os artigos 26 e 27 da Convenção de Viena sobre direito dos tratados, adotada pela ONU em 23 de Maio de 1969: “Artigo 26 – Todo tratado em vigor obriga às partes e deve ser cumprido por elas de boa-fé”. “Artigo 27 – Uma parte não poderá invocar as disposições do seu direito interno como justificação do incumprimento de um tratado…”.
CONCLUSÃO
A pena de morte foi extinta em todo o mundo desde Dezembro de 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, que proclama, sem exceção, sem restrição e diante de qualquer circunstância ou situação do condenado, o Direito à Vida. Espera-se que a República da Indonésia reveja a condenação à morte imposta a Marco Archer e a todos os demais condenados à mesma pena, poupando-os da morte e, com isso, se curvando o Estado Indonésio às legislações internacionais que a própria Indonésia subscreveu e aderiu.
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Hoje, 6a.feira, 16 de Janeiro de 2015, por via eletrônica e baseado nos fundamentos deste artigo, anuncio que impetrei ordem de Habeas-Corpus junto à Suprema Corte da Indonésia (Kejaksaan Republik Indonesia), ao procurador-geral indonésio M.Prasetyo, com cópia ao senhor Sudaryomo Hartosudarmo, Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Indonésia no Brasil, a quem foi pedido também o encaminhamento do HC à Alta Corte de Justiça da Indonésia e, ainda, ao presidente indonésio Joko Widodo com pedido de revogação da pena de morte imposta a Marco Archer.
Foi assim, por idêntico meio, que em 17.8.2010 também impetrei Habeas-Corpus junto ao Ayatollah Sayed Ali Khameney, lider espiritual da República Islâmica do Irã, ao Ayatollah Sadeqh Larijani, Chefe do Poder Judiciário do Irã e a Mohammad Javad Larijani, Secretário do Conselho Superior de Direitos Humanos da República Islâmica do Irã. No HC pedi que a iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, cuja execução da pena capital por apedrejamento estava marcada para 3 dias após, (20.8.2010) fosse suspensa e, afinal, revogada. Deu certo.
Não custa tentar. A iraniana, meses depois, foi posta em liberdade. Até hoje. Graças a Deus. Deus é Grande.