Por: Vilson Aparecido da Mata (professor da Universidade Federal do Paraná)
Costumamos pensar que os conflitos entre civis e militares são ocorrências distantes, de países nos quais os conflitos levam a estados de sítio e, ainda, que a violência oficial do Estado seja um instrumento utilizado por governos fracos para reprimir a população e impor, à força de bombas e balas, os interesses que melhor definem tais governos, como é o caso da Síria, por exemplo.
Também costumamos pensar que o ataque aos direitos civis, o massacre de pessoas que se manifestam, confiando na democracia, em defesa daquilo que consideram justo, seja obra de ditaduras impiedosas e insensíveis. Pois a impiedade e a insensibilidade bateram à nossa porta no dia 29 de abril de 2015 e disso temos de tirar uma lição.
As cenas de barbárie, terror e desmedido uso de força policial contra uma modesta multidão desarmada de professores e professoras, ontem, no assim chamado “Centro Cívico” de Curitiba, inspiram em todos nós, trabalhadores da educação brasileira, profunda vergonha. (Havia lá outras categorias de servidores públicos, com as quais nos solidarizamos, mas este texto é sobre professores e professoras).
Vergonha por presenciar, dia após dia, a precarização cada vez mais extremada da educação brasileira; vergonha por viver em uma época na qual professores e professoras são abatidos em plena praça pública, diante do olhar horrorizado de milhões de brasileiros; vergonha por presenciar um banho de sangue desnecessário, vingativo, despudorado e covarde.
A nossa vergonha é ainda maior pela Polícia Militar do Paraná, que na sua história acumula mais de uma mancha de ataque violento contra professores (não nos esqueçamos de agosto de 1988, nunca!). E nos sentimos envergonhados ainda ao saber que aqueles policiais que não se curvaram ao desmando truculento do poder Executivo e se recusaram a abater professores em praça pública estão presos, a eles nosso respeito.
Contudo, diante de tudo isso, há lugar para um orgulho que cresce em nós e que a história haverá de resguardar. Orgulho por ver valentes professores e professoras, massacrados por uma força policial beligerante e fortemente armada, ainda manter a dignidade de suas convicções. Orgulho por entender que em cada professor ferido há uma aula de cidadania e coragem que nossos alunos haverão de aprender.
É preciso ainda nos orgulhar daqueles que, feridos no verdadeiro campo de massacre em que se transformou a praça pública, ainda procuravam defender colegas. Orgulho pelos homens e mulheres, educadores do Paraná, que diante do horror mostraram ao mundo a verdadeira face de um regime autoritário e intolerante, que se apresenta como “democrático”.
Houve no dia 29, no assim chamado “Centro Cívico” de Curitiba, uma aula campal. Os professores e professoras nos ensinaram que o banho de sangue não foi em vão, que a dignidade está na luta e que a pusilanimidade chocante do ataque fere o corpo, sangra, mas não derrota a honra daqueles que lutam por um mundo melhor e por uma condição de vida e trabalho condizentes com o essencial papel dos mestres na vida de uma nação.