Por Mauro Lopes, para o Jornalistas pela Democracia -
Fonte: 247 nas redes sociais - Outra onda de ataques dos católicos ultraconservadores, de perfil fundamentalista, contra o Papa está em pleno curso -começou na última terça-feira (30). O objetivo é derrubar Francisco.
É a terceira tentativa de golpe da extrema-direita católica desde novembro de 2016, quando quatro cardeais, os alemães Walter Brandmüller e Joachim Meisner, o italiano Carlo Cafarra, e norte-americano Raymond Burke, divulgaram uma carta privada que haviam enviado dois meses antes a Francisco. A carta ficou conhecida como “dubia” (dúvida), mas não apresentava dúvida alguma, era na verdade um ataque frontal à exortação apostólica Amoris Laetitia sobre o amor na família -especialmente pela abertura para que os casais de segunda união pudessem comungar.
Depois, em setembro de 2017, um grupo de 62 teólogos e padres, igualmente de extrema direita, emitiram uma ‘Correctio filialis de haeresibus propagatis’ (literalmente, ‘Uma correção filial concernente à propagação de heresias’), que nada tinha de filial, era um novo e violento ataque ao papa.
Há dois dias, uma nova onda. Um grupo de 19 teólogos e católicos fundamentalistas renovou o ataque ao Papa acusando-o formalmente de “heresia” e, na prática, conclamou o colégio de cardeais a depor Francisco -a carta foi enviada a todos os bispos do mundo e especialmente aos 222 cardeais que compõem o colégio eleitoral papal.
Não há nenhum brasileiro na lista de assinaturas da carta que concita à deposição de Francisco, mas os fundamentalistas católicos do país têm sido ativos na articulação global; em 2019, trouxeram ao país o cardeal Burke, o principal porta-voz da do grupo, e ele foi tratado como um santo, em meio a suas roupas milionárias, com um sem-número de capas e dobras. Na última semana, veio ao Brasil o Cardeal Gerhard Muller, ex-prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, deposto pelo Papa em 2017, e novamente foi recebido em êxtase pela ultradireita. Recebeu salamaleques de ninguém menos que o cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Odilo Pedro Scherer.
As acusações ao Papa não são diferentes dos ataques que os fundamentalista realizam no Brasil aos democratas, à esquerda e, historicamente, à Teologia da Libertação. No ataque de agora, há uma ampliação do escopo das críticas ao Papa. Elas soam como inacreditáveis para qualquer pessoa minimamente tolerante, aberta ao outro, mas estão lá. Quais são as mais significativas?
1. O Papa defende o direito à comunhão de pessoas divorciadas que voltaram a se casar;
2. O Papa é aberto ao acolhimento dos homossexuais na Igreja;
3. O Papa defende uma postura de compreensão em relação às mulheres que fazem aborto;
4. O Papa está aproximando os católicos dos protestantes, encerrando a guerra teológica de séculos; o Papa afirmou mais de uma vez que as intenções de Martinho Lutero "não eram equivocadas" e assinou um comunicado conjunto com luteranos no qual mencionava os "presentes teológicos" da Reforma protestante. Para os fundamentalistas, Lutero é quase uma encarnação do diabo.
5. O Papa está cometendo o “delito” de aproximar católicos e muçulmanos -os ultraconservadores respiram até hoje o espírito das Cruzadas. No texto de acusação a Francisco, foi criticado o comunicado conjunto que o ele assinou em fevereiro com o Grande Imam de Al-Azhar Ahmed Al-Tayyibum no qual se afirma que a diversidade de religiões é um "desejo de Deus".
Na lista de acusações há também uma falsificação típica da onda de fake news da extrema direita: acusa-se o Papa de “conciliar” com os abusos sexuais cometidos por padres, bispos e cardeais. A acusação é uma inversão completa, pois Francisco está virando a Igreja do avesso para apurar os crimes e punir os responsáveis, que foram protegidos historicamente pelas hierarquia conservadora católica, especialmente pelo Papa que é um dos ícones do fundamentalismo, João Paulo II.
Em suma, o Papa é acusado de amar! Amor aos divorciados, aos gays, às mulheres que abortam aos protestantes, aos muçulmanos. Para os ultraconservadores, o amor é o maior dos pecados. Para eles, como para seus aliados, os fundamentalistas evangélicos, o que importa é a regra, a exclusão, a acusação -um resumo do documento pode ser lido, em inglês, no site católico ultraconservador Life Site News, dos EUA ou em espanhol na íntegra no site InfoVaticana.
O documento ganha relevância no Brasil porque está reunida desde ontem a 57ª Assembleia Geral da CNBB, a conferência dos bispos brasileiros, que deverá eleger a nova direção da entidade. A extrema-direita católica está ensaiando conquistar a direção da entidade, o que levaria a Igreja no Brasil a ter um bolsonaro em seu comando, abrindo guerra com Francisco. É importante acompanhar. E defender o Papa.
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