Fonte: Assessoria de comunicação - CIMI
“Aconteceu essa tragédia e estamos nessa situação… triste. Uma dor, um coração nosso que se vai”, relata o irmão do indígena
Erisvan Soares Guajajara, de 15 anos, havia saído da Terra Indígena Arariboia, há cerca de duas semanas, para acompanhar o pai, Luizinho Guajajara, ao município de Amarante, no Maranhão, que fica a 683 quilômetros da capital São Luís. À cidade se dirigiram para com a aposentadoria do pai comprar mantimentos e roupas, hábito comum aos indígenas que saem dos territórios para nos centros urbanos encontrar aquilo que não plantam, tecem, caçam ou colhem. A viagem acabou de forma trágica nesta sexta-feira (13) quando o corpo do jovem indígena foi encontrado esquartejado em um campo de futebol localizado em Amarante.
“Vieram até para comprar umas roupinhas para ele (Erisvan), mas não conseguiram voltar”, diz o irmão da vítima, Luiz Carlos Guajajara. Bastante abalado, o indígena afirmou que Erisvan morava na aldeia Arariboia, onde estudava. “Aconteceu essa tragédia e estamos nessa situação… triste. Uma dor, um coração nosso que se vai”, relata. Ainda não se sabe as circunstâncias do crime, mas aparentemente Erisvan foi assassinado a golpes de faca. Não há notícias sobre o paradeiro ou a identidade dos criminosos.
O irmão de Erisvan afirma que “tem que ter alguma Justiça para investigar isso. Precisamos de que se preocupem com o que está acontecendo conosco”. À imprensa local, a Polícia Militar declarou que o assassinato ocorreu durante uma festa no bairro Vila Industrial, na noite de quinta-feira (12). Junto ao corpo de Erisvan, estava o de um homem de 31 anos, não indígena, também esquartejado. A polícia suspeita que as mortes ocorreram por um suposto envolvimento das vítimas com o tráfico de drogas.
Informação não confirmada por lideranças Guajajara e pelos familiares de Erisvan. “Era um menino tranquilo, como qualquer outro menino da idade dele. Vivia na aldeia. Ia para a cidade uma vez ou outra”, explica o irmão. De maneira precipitada, com uma pressa oposta à habitual apatia diante de casos de violência nos territórios, e sem aguardar o término das investigações, a Fundação Nacional do Índio (Funai) soltou uma nota afirmando que “segundo a polícia (…) estão descartadas todas motivações de crime de ódio, disputa por madeira ou por terras”.
Para o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Maranhão, Gilderlan Rodrigues, o trecho da nota da Funai é lamentável porque “parece uma isenção, como se o órgão não tivesse a ver com o fato. Há uma sequência de violência afligindo o povo Guajajara e a Funai deveria olhar para isso”. Para Rodrigues, a postura da polícia e da Funai em querer antecipar o resultado das investigações de um crime com requintes de crueldade “é como matar mais uma vez o indígena”.
Sônia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), foi enfática em seu pronunciamento nas redes sociais: “São muitas falácias, muitas versões, acusações, não interessa, ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém”, escreveu.
“Não é apenas um cenário de guerra, estamos num campo de batalha onde o ódio disseminado pelas forças políticas conservadoras, autoritárias, racistas são estimuladas pelo fascismo que já extrapolou todos os seus limites”, completou a liderança indígena que esteve, nas últimas semanas, em agenda com organismos internacionais de direitos humanos denunciando as violências sofridas pelos povos indígenas no Brasil. No Maranhão, especificamente entre o povo Guajajara, essa violência ceifou a vida de quatro indígenas, contando com Erisvan, desde novembro.
Sequência de violência
Os Guardiões da Floresta Paulino Guajajara e Laércio Souza Silva partiram da aldeia Lagoa Comprida, norte da Terra Indígena Arariboia, a 100 km do município de Amarante, para na mata caçar. Perto de um igarapé, foram surpreendidos por cinco madeireiros armados que os aguardavam em emboscada. Sem esperar qualquer reação dos indígenas, os madeireiros, em maior número, começaram a atirar. Um dos disparos atingiu Paulino no rosto que morreu na hora. Laércio foi alvejado no braço e nas costas, mas conseguiu escapar.
No dia 7 de dezembro, um grupo Guajajara foi atacado a tiros enquanto percorria em motocicletas um trecho da BR-226, próximo à aldeia El Betel, na Terra Indígena Cana Brava, no município de Jenipapo dos Vieiras. Dois caciques foram mortos: Firmino Prexede Guajajara, de 45 anos, da aldeia Silvino (TI Cana Brava), e Raimundo Benício Guajajara, de 38 anos, da aldeia Decente, Terra Indígena Lagoa Comprida. Outros dois indígenas ficaram feridos.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, anunciou na segunda-feira (9), por meio de portaria, o envio de tropas da Força Nacional para proteger indígenas, não indígenas e servidores públicos na Terra Indígena Cana Brava. Porém, o documento excluiu a Terra Indígena Arariboia, a aproximadamente 200 quilômetros da Cana Brava, que apresenta o maior número de invasões, roubos de madeira e caça ilegal na região. E agora mais uma vítima da onda de violência que assola o povo Guajajara.