Débora Zampier (Agência Brasil) - O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), votou hoje pela absolvição do réu João Paulo Cunha do crime de corrupção passiva. Essa é a primeira divergência entre o revisor e o relator Joaquim Barbosa, que votou pela condenação do parlamentar nesse quesito.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, o então presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, recebeu R$ 50 mil para privilegiar a SMP&B Comunicação, de Marcos Valério, em contrato de licitação na Casa. O dinheiro foi sacado em espécie pela mulher de João Paulo Cunha, Márcia Regina, em uma agência do Banco Rural em Brasília.
A defesa de João Paulo Cunha alega que o parlamentar não tinha influência na comissão licitatória que escolheu a SMP&B entre outros seis concorrentes. Os advogados confirmam o saque de R$ 50 mil, mas informam que o valor foi liberado pelo PT e era destinado ao pagamento de pesquisas eleitorais na região de Osasco.
Para Lewandowski, não há corrupção se não ficar provado que houve ação ou omissão do funcionário publico como contraprestação da vantagem indevida. “Forçoso é concluir que o Ministério Público não logrou produzir uma prova sequer, nem mero indício, de que João Paulo Cunha trabalhou para favorecer ou dar tratamento privilegiado à SMP&B”, destacou.
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ACUSAÇÃO “ABSTRATA”
De acordo com o ministro, a acusação do Ministério Público foi “abstrata”, pois todas as provas colhidas no processo comprovam que a comissão licitatória atuou de forma independente na escolha da SMP&B. Ele ainda lembrou que a contratação foi considerada legal pelo Tribunal de Contas da União e que nenhum concorrente contestou o resultado.
Lewandowski também entendeu que ficou “largamente provado” que os R$ 50 mil sacados por João Paulo Cunha não eram propina e, sim, quantia disponibilizada pelo PT para pagar pesquisas eleitorais. Para o revisor, as provas indicam que o dinheiro foi solicitado ao ex-tesoureiro nacional do PT Delúbio Soares, pois a região de Osasco era considerada prioritária para a legenda.
O revisor ainda entendeu que os presentes dados por Marcos Valério a João Paulo Cunha – uma caneta Montblanc e passagens aéreas para a secretária do parlamentar – não provam que houve corrupção. “Há ausência do ato de ofício cometido em contrapartida, de resto não identificado pela acusação”, concluiu.
O culpado foi o mordomo
Carlos Chagas/Tribuna da Imprensa
O namoro e o noivado foram explosivos mas o casamento ia bem. O diabo é que ainda na lua de mel o casal entrou em crise. Separou-se. As previsões são de um divórcio litigioso.
Falamos de Joaquim Barbosa e Ricardo Lawantowski, que ontem voltaram a divergir, no julgamento do mensalão. Depois de baterem de frente, como relator e revisor, coube a Lewandowski surpreender o Supremo Tribunal Federal e votar com Barbosa na condenação de um ex-diretor do Banco do Brasil, Henrique Pizollato, de Marcos Valério e de mais dois penduricalhos. Nessa primeira etapa, faltava completar as acusações contra o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha, que o relator condenara por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
Pois não é que nos três casos o revisor saiu em defesa do deputado? Sustentou que receber 50 mil reais de uma agencia do Banco Rural foi operação normal, porque havia pedido ao PT esse dinheiro para pagar pesquisa feita em Osasco. Esqueceu-se de explicar porque o dinheiro, em vez de vir do PT, veio de Marcos Valério, e numa agência do banco implicado com a lambança. Afinal, Valério não era tesoureiro do partido. Mas tem mais. A acusação de favorecimento a uma agencia de publicidade pertencente a Marcos Valério, que recebeu antecipadamente milhões da Câmara, mas não cumpriu o contrato, foi transferida por Lewandowski do então presidente da casa para o diretor-geral, como se este não fosse nomeado e nem cumprisse ordens daquele. Só faltou argumentar que o culpado era o mordomo…
Novo refrigério do ministro-revisor referiu-se à ausência de atos de ofício, quer dizer, faltaram papéis assinados por João Paulo autorizando falcatruas. Guardadas as proporções, é como se Al Capone tivesse assinado ordem autorizando seus capangas a promoverem o massacre do Dia de São Valentim…
O resultado do divórcio entre Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski pode redundar numa inversão de tendências na mais alta corte nacional de justiça, caso outros nomes emblemáticos do PT venham a ser defendidos com tanta ênfase pelo relator, ainda que tudo vá depender do voto dos outros ministros. Se João Paulo acabar absolvido, por que não José Genoíno, Delúbio Soares e José Dirceu, para não falar em deputados de outros partidos que se lambuzaram no mensalão?
Vai ficando claro que as primeiras impressões são supérfluas, que Lewandowski não é aliado, mas mesmo o contra-ponto de Barbosa, quer dizer, assume a defesa dos réus. Tudo pode mudar amanhã, mas se o Supremo decidir que não houve mensalão, só desvio de dinheiro público e privado para pagar contas de antigas campanhas eleitorais, o remédio será chamar Pedro Álvares Cabral para começar tudo de novo. E nem se lembre que mesmo no caso de punição para alguns mensaleiros, nenhum deles acabará na cadeia, como prenunciou o ex-ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – João Paulo Cunha, na época, disse que a mulher foi à agência do Banco Rural para pagar a TV por assinatura. Mas o fato é que ela saiu de lá com R$ 50 mil na carteira. A impressão que fica é de que Lewandowski vai dar uma no cravo e uma na ferradura, como se dizia antigamente.