Os teólogos, ao analisar estes escritos de São Paulo, ficam em dúvida sobre ser realmente uma carta. Isso fica claro se forem retirados o começo (1,1-2) e o fim de Efésios (6,21-24), considerados por muitos estudiosos como acréscimos posteriores, o texto apresenta poucas características de carta. Assemelha-se mais a um discurso, sermão ou homilia.
De fato, o texto é composto, entre outras coisas, de hinos (1,3-14; 1,20-23; 2,14-18), doxologia (3,20-21) e orações de ação de graças e súplicas (1,15- 19) e pedidos (3,14-19). Alguns estudiosos afirmam estarmos diante de uma liturgia. Essas peculiaridades aproximam o texto de Efésios a outros textos do Novo Testamento considerados homilia ou sermões, como é o caso de Hebreus.
O segundo ponto, a saber, é se foi escrita aos Efésios mesmo. A maioria das Bíblias traz em 1,1 a palavra Éfeso, mas alguns manuscritos antigos desse texto, considerados importantes, não têm a expressão “que estão em Éfeso” ou “que moram em Éfeso”. O texto original de 1,1 deveria ser então assim: “Paulo apóstolo do Cristo Jesus, pela vontade de Deus, aos santos e fiéis ao Cristo Jesus: graça e paz à vós da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo”.
Pois bem, no lugar em que se encontra hoje a expressão que estão em Éfeso, ou que moram em Éfeso, deveria ter um espaço para que aí fosse inserido o nome de alguma comunidade cristã da Ásia Menor, por exemplo, Laodicéia (Cl 4,16), ou outra qualquer, como Pérgamo, etc.
A partir disso, muitos estudiosos afirmam que a carta aos Efésios teria sido um texto circular, uma espécie de “carta aberta” às comunidades daquela região, inserindo-se no espaço em branco de 1,1 o nome da respectiva comunidade.
Outra dificuldade é determinar onde e quando foi escrita. Sabemos que Paulo, com raras exceções, costumava ditar suas cartas, mas a data certamente deve situar-se após sua morte (calcula-se que tenha sido decapitado no ano de 68). A comunidade de Efésios teria sido criada nos anos em que surgiram as obra de Mateus e Lucas (Evangelho e Atos). Uma provável data seria na década de 80.
Sabe-se hoje que Lucas, nos Atos dos Apóstolos, entre outros objetivos, tinha o de resgatar a imagem e as obras de Paulo (evangelização, fundação de comunidades etc), contestadas por grupos cristãos conservadores ligados sobretudo a Tiago e à Igreja de Jerusalém. Estaria a assim chamada carta aos Efésios fazendo parte desse plano resgatador da vida e das tribulações de Paulo. Alguém, ligado às tradições e ensinamentos deixados por esse campeão da fé e da evangelização na metade do século I, usa o nome de Paulo apóstolo (1,1) e prisioneiro (3,1; 4,1) para, entre outras coisas, não permitir que tanto esforço e sacrifício terminassem em nada. Na carta, Paulo é apresentado como ministro do Evangelho (3,7) que, por causa disso, enfrenta tribulações (3,13). Nesse caso, pouco importa saber o lugar de onde Efésios foi escrita.
A maioria dos estudiosos, contudo, sabendo dos planos de Lucas em Atos, é da opinião que Lucas omite uma prisão de Paulo em Éfeso. Vamos ver isso de perto. Durante a terceira viagem missionária (anos 53 a 57) descrita em Atos (18,22-21,16), Paulo deteve-se por quase três anos em Éfeso (19,8.19; 20,31). Por quê? Talvez por motivos estratégicos de evangelização e também por motivos de força maior, como uma eventual prisão.
Mario Eugenio Saturno (cientecfan.blogspot.com) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.