O Moa era dessas pessoas que não sabem o que são relações curtas. Se você conseguiu entrar no seleto círculo de confiança do Moa é porque experimentou o que é ter um amigo e um parceiro para a vida. Não havia relações curtas nem mesmo com os colaboradores; todos os que entraram em sua vida para valer, se tornaram amigos, parceiros de uma vida. Esse é o Moa que de fato quero homenagear.
Lembro-me de nossa infância em Itapiranga. Ele era o campeão da “bolita” e ostentava com orgulho um saquinho cheio delas, amarrado na cintura como um troféu para instigar os colegas ao jogo. Melhor ainda no “bafo”, papava todas as figurinhas do chiclete Ploc. Éramos cercados de magia, apesar das dificuldades, porque ele construía todos os nossos brinquedos. A rua era cheia de pernas-de-pau, carrinhos de rolimãs, triciclos, bodoques, arcos, flechas, índios e cowboys. A bola sempre no pé descalço e na unha do dedão quebrada. As casas na árvore e a corrida com casca de coqueiro nas descidas dos potreiros, os passeios de carroça na Linha Soledade. Mas, o sonho maior era ter uma bicicleta, que veio num Natal em forma de Monark barra forte.
Éramos seis irmãos (uma escadinha) e uma só forma de viver: tudo era feito junto, as peraltices, as surras, a percepção de que podíamos ser tudo o que escolhêssemos ser. E fomos!
Quem foi amigo do Moa teve um privilégio ao longo da vida. Cada chimarrão, café, taça de vinho ou cerveja virava uma lição, um conselho, um caminho, uma possibilidade. Falar sobre planos futuros, ouvir os problemas dos outros e dar conselhos era uma rotina que parecia lhe fazer bem. Sempre pronto para um café na Rádio, escolhia xícaras de louça, daquelas grandes de boca larga, porque se a conversa era boa merecia um café demorado. Receber os amigos para um churrasco era uma paixão. Sempre tinha um tempero diferente para testar, ou uma ovelha para preparar. Não podia saber que alguém, de quem ele gostava ou admirava de longe, estivesse com problemas ou triste, que a mão amiga se estendia como um tapete de “olá, tô precisando de alguém pra me ajudar aqui, e pensei justamente em você”.
O homem de estatura grande nunca passou de um menino, que amava bala de goma, jujuba e chocolate. Que quando tinha um problema realmente sério ia buscar refúgio no pai, tomando um chimarrão na mesa de eucalipto, embaixo da árvore das flores brancas e perfumadas. Que no meio da semana mais atribulada chegava na casa da mãe para tomar um café e trazia consigo o pão de milho, nata, melado e salame. E ali se deixava ficar por horas curtindo o colo da mãe. Ele era o pai amoroso que tinha hábito de dar um beijo nos filhos, mesmo que eles já se achassem crescidos demais para isso. O pai presente que tinha na agenda de telefone os três filhos registrados como “Amigão”, “AAmigão” e “AAAmigão”. Assim, sempre eram os três primeiros números a aparecer.
O Moa também era o irmão que se tornou o pai quando nosso pai faltou! Nem sempre de temperamento fácil, mas jamais de atitude negligente frente às necessidades da família. Para qualquer dificuldade, o Moa sempre era um cais acessível para aportar. Adorava se reunir na mãe para a galinhada, a sopa, o churrasco. Amava cozinhar e estar junto de todos. Mas sobretudo amava a simplicidade das coisas do cotidiano.
O Moa tinha uma disposição invejável para projetos difíceis, obras complexas e eventos gigantes. Enxergava oportunidade em tudo, até quando ninguém mais via. Não acertava sempre, mas cada acontecimento ruim levava a um novo contexto de realidades possíveis. Não desistia de nada, e para todas as coisas que se dispunha a realizar, tinha nos olhos o mesmo brilho do menino que fazia pernas de pau para os irmãos brincarem.
Amou muito. Se deu por inteiro. Nunca se economizou. E não poderia ser diferente para alguém que era tão grande que não cabia em si.
Hoje me despeço desse meu irmão com quem dividi 26 anos de trabalho. A maioria deles com muitas dificuldades financeiras. Sei que todos que conviveram com o Moa tem ao menos uma história incrível para contar, e é isso que o faz se eternizar. Lembrei-me agora de uma vez que fomos visitar um cliente em outra cidade, e passando do meio dia não tínhamos dinheiro para os dois almoçarem. Paramos num PF de beira de estrada, ele entrou, se serviu generosamente, pagou, e veio em minha direção. Sentou-se, mostrou 02 jogos de talheres e me deu um deles. Empunhou o garfo e a faca e disse: “o bife é teu, eu fico com o ovo frito, e ainda está mole, do jeito que eu gosto”. E assim dividimos o prato, como dividimos a vida de trabalho, e nos reerguemos dezenas de vezes ao longo desses 26 anos. Esse é o Moacir Hanzen que meu coração vai imortalizar. Todo o resto é vaidade.
Márcia Hanzen
“Todos os dias é um vai e vem. A vida se repete na estação.